Tem de reconhecer, meu velho, a sua figura cria uma certa repugnância a quem priva consigo. Parece-lhe normal que com sessenta anos se vista e comporte como uma senhora? Caramba, você ainda é casado, tem uma mulher a aquecer-lhe a cama, um filho malcriado, drogado ou pedinte, não interessa, que percorre Lisboa na pedincha de migalhas para uma dose. Bem sei que ganha para si, o suficiente para alimentar a boca da mãe, os vícios do filho, o almoço de domingo em família. Pense numa coisa, cantar à noite numa cave esconsa, repleta de homens salivantes, alheios à digna arte do playback, é tudo menos próprio para um si, homem de deus. Soraia, Soraia, eu não posso identificá-lo dessa forma, estamos num hospital público, não num circo de aberrações. Dê-me um nome próprio, apelido. Já me dou por satisfeito, senhor… vá, vá, pare com os enjoos, não me vomite a secretária, a medicação não o impele para tamanha fantochada, esses tremeliques são um truque fácil para se alhear da consulta. É a minha