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a testemunha

Peço-te que por agora não chores. O diagnóstico do médico não é assim tão mau. Escuta, a inflamação no ouvido é minha, não tua. Por que é que não apertaste a mão ao senhor doutor? Ele foi solícito comigo, atento. Deixar alguém de mão estendida é falta de educação.


Pronto, eu cedo. Nas próximas semanas podes-me pôr as gotas, relembrar-me onde está o antibiótico, accionar o despertador para que a hora da medicação não fique esquecida. Sim, acordas comigo: vais encher o copo de água à cozinha e voltas para o meu lado. Tens razão, assim não preciso de me destapar, os meus pés não se arrepiam com o frio da tijoleira. Se o gato miar não te assustes, ele ainda não se habituou à tua presença, faz-lhe uma festa que ele volta a aninhar-se no sofá. Tranquilo.

Quando eu ficar bom prometo sair mais contigo, dar um passeio grande, demoramos o tempo que quiseres. Podemos ir aquela praceta do outro dia – chovia, nós abrigámo-nos e comemos um éclair cada um. Mesmo assim o teu era maior do que o meu. Gulosa. O teu café duplo, o meu simples e com uma pontinha de leite frio. Não, não digas isso, não foi depois dessa tarde que fiquei pior, eu já estou assim desde Janeiro. Sabes, andei a brincar ao Ano Novo, deitei fogo-de-artifício para mais de cem pessoas. Fui o mágico da aldeia por umas horas e olha, um vírus apanhou-me distraído no meu entusiasmo.



Vá, volta atrás, corta com a má impressão que causaste. Limpa as lágrimas e os olhos esborratados do rímel. Eu posso ficar aqui à porta do consultório. Está certo, eu cubro-me com o teu casaco, aconchego-me nele, enquanto me deixas só. Agora vai. Vai.

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