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ancorar: colher flores

Inspiro profundamente. O teu cheiro libertava-se do lençol como se ali estivesses, adormecida, enroscada em mim. Nunca durmo quando o fazes. A vigilância permanente das noites alimentam-me o amor, disparam a adrenalina do que se vive lá fora.
Despertamos juntos, murmuras palavras vagamente familiares: sei, soletras o meu nome sílaba a sílaba, completas o puzzle. A adivinha da manhã começou, O-QUE-VAMOS- FAZER-MAIS-LOGO? De seguida abraças-me, segredas-me os sons do dia que aí vem.
Cai a noite, estamos entregues aos sentidos de um amor desejado. Juntamos os corpos na intimidade, os focos de luz disputam connosco o brilho das estrelas.

Amanhã cedo levantar-me-ei de novo sem ter pregado olho. Só o rasto do meu caos te conduzirá às memórias frescas, ainda e sempre vivas.

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da via panorâmica

A nossa casa é linda. Repara como aqui apertadinhos estamos tão bem um para o outro. Aqui tudo é teu e meu; nosso, nosso, quero eu dizer! Deixa-me ver, temos o lençol, este saco-cama velho e sujo, a roupa que trazemos no corpo e pronto. De resto nada, de mais nada. Estendidos na relva, de papo para o ar, nem as paredes de uma velha casa em ruínas nos separam do trânsito e das pessoas. Por vezes, pelos menos para mim, o dia custa a passar: levantar-me todos os dias, percorrer um par de metros, parar em frente ao centro comercial e implorar pela misericórdia de quem entra e sai das lojas; cansa-me. De segunda a domingo – sempre, sempre na iminência de nem uma migalha ter para partilhar contigo – deixa-me triste, muito mesmo. Desculpa. Sabes bem que o que nos faz andar nisto é o vício, a dependência de umas gramas de pó, para mim e para ti, em comunhão. Podíamos pensar em trabalhar como todos eles. Sim, a tempo inteiro, a fazer qualquer coisa. Vejo-me até a lavar escadas, a limpar a

de ontem

Fiz-me ao caminho, rumei a Norte. Para trás deixei tudo, aqueles que amava, que detestava, que me eram indiferentes. Ouvi aqui e ali que era doido. “Deixas assim o sítio que te viu nascer?”, “ Mas, e o amor? o nosso amor…”. Nada lhes respondi. Durante anos, olhei para o chão, agora feito de granito, escuro, mesmo em dias em que a luz toma conta dos dias. Sempre na sombra de outros, à espera de acordar de novo, fazer de conta que os caminhos incertos eram os mesmos de outrora, as plantas, os turistas… Com o corpo pesado, a mente turva de ideias vazia, vagueio em terra alheia. Mudar custa sempre, ainda que entre mim e o passado presente, haja somente a distância de um braço de rio.