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da hera

Um fundo azulado, tranquilo, enquadram uma planta, aparentemente forte, plena de vitalidade a julgar pelo ramo. E no entanto ela espera, murcha ou envergonhada. A mão por debaixo, na esperança de uma cura, aguarda, quem sabe, amparar a queda das folhas sem vida, caducas, que renovarão a sede do rejuvenescimento, cíclico na natureza e bebido a cada instante por cada um de nós, mortais.
Se no entanto nos contaminar o olhar da perspectiva do mal humano, tudo muda: a respiração ofegante da pobre criatura vegetal, enfrenta num rompante a gula perniciosa da extensão do braço humano. A nudez exposta dos rebentos, criaturas lactantes presas às ramificações de sua mãe, enfrentam expectantes a dor latente do colo alheio. E a desgraça submerge a cena. Não nos resta mais nada, senão o uivo perene da natureza em flor.

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A nossa casa é linda. Repara como aqui apertadinhos estamos tão bem um para o outro. Aqui tudo é teu e meu; nosso, nosso, quero eu dizer! Deixa-me ver, temos o lençol, este saco-cama velho e sujo, a roupa que trazemos no corpo e pronto. De resto nada, de mais nada. Estendidos na relva, de papo para o ar, nem as paredes de uma velha casa em ruínas nos separam do trânsito e das pessoas. Por vezes, pelos menos para mim, o dia custa a passar: levantar-me todos os dias, percorrer um par de metros, parar em frente ao centro comercial e implorar pela misericórdia de quem entra e sai das lojas; cansa-me. De segunda a domingo – sempre, sempre na iminência de nem uma migalha ter para partilhar contigo – deixa-me triste, muito mesmo. Desculpa. Sabes bem que o que nos faz andar nisto é o vício, a dependência de umas gramas de pó, para mim e para ti, em comunhão. Podíamos pensar em trabalhar como todos eles. Sim, a tempo inteiro, a fazer qualquer coisa. Vejo-me até a lavar escadas, a limpar a

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