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entre irmãos

Bruto, estúpido, cabrão de merda!


As tuas mãos no meu pescoço quase que me estrangulavam. Senti-me com falta de ar, comecei a ficar primeiro vermelho, depois quase roxo e tu rias ininterruptamente, sem piedade nem comiseração pelo teu irmão mais novo.

Se fui apanhado no parque de ténis a roubar bolas foi por tua culpa! Tu e os teus amigos é que queriam encher sacos e sacos delas. Novinhas em folha, daquelas ainda com muito pêlo, macias ao toque, duras e saltitonas. Não que saibam jogar alguma coisa de jeito. Vocês são fracotes, azelhas mesmo, mal conseguem fazer passar a bola de um lado para outro da rede mais do que duas vezes seguidas. Querem exibir-se para as miúdas, mostrarem o quanto são fortes, dignos de admiração e cobiça. Parvos, vocês são uns parvos, ouve o que te digo. Eu já me consegui aproximar do grupo das miúdas, escutei-lhes os desejos e sabes que mais, para elas tu e os teus amigos não passam daqueles gelados de Verão, daqueles que se compram só por não se ter dinheiro para mais e que depois de uma ou duas lambidelas se atiram ao lixo sem deixar saudades. Mal acabem as férias grandes lá vão os valentões carpir as lágrimas das amadas ingratas, que não atendendo à força incontrolada de quem se quer fazer homem antes da idade na grande cidade, rei do bairro. Partem sem olhar para trás, fiéis as suas aldeias no interior, de mão dada com os progenitores, sem sequer virarem a cara para murmurarem “até breve”.



Digo-te mais, os pais quando mais logo chegarem a casa hão-de desfazer-te em pedaços, a minha nódoa negra vai ganhar contornos de crime, ficará dias a anunciar ao mundo a tua insensibilidade, animal.

Estás tramado.

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